Hoje é dia do meu porto seguro
Téo José
Tem tempo. Mas são as lembranças mais vivas na minha cabeça. Jogar bola na região da rua três setor oeste. Campo de terra, que a cada nova casa mudava de lote. Era difícil algum dos mais de uma dezena de adversários do setor Sul, Marista ou Bueno nos bater. Durante um tempo chamávamos CEUB, porque gostava do distintivo do antigo clube do DF. Futebol no Externato São José. Armadilhas nos lotes vagos. Campeonatos nas quadras publicas do “Abrigo dos Velhos”. Pequeno comercio de limonada ou laranjada na porta de minha casa ou do amigo de alma Guto. Procurar o macaco Chico, mais uma vez fugido de casa. Inúmeras conversas no fim de tarde, inicio da noite sentado no meio fio. Mascote do meu time, no antigo estádio Olímpico. Ficava no banco sentadinho durante o jogo, calções brancos e camisa verde, brincando com as luvas do reserva Lumumba e vibrando com gols do Lincoln, o “Leão da Serra”. Treinos no Goiânia EC. Preliminares do Serra Dourada, com o time da galera. Dois pênaltis defendidos contra o Atlético.
Depois as primeiras paqueras, matinê na Number One, Tucanos. Primeiros bares. A cachaça com limão do Carlitos. Nossa! parece que foi hoje. O dinheiro só dava pra cachaça mesmo, que na época era pinga com limão mesmo. Saia do treino da seleção do Marista e ia direto, caminhando e depois se virava pra chegar em casa. Nada de carro ou ônibus.
Último dia de aula escola, a bagunça era em casa. Ultima chance de paquerar quem já estava de olho e não tinha coragem de chegar e sabia que poderia ficar quase três meses sem ver, porque as férias iriam começar.
A vida era tão boa e intensa, que até “bombar” em um ano armei, para não deixar a seleção de futebol. Cabecinha vazia mesmo, mas feliz.
Depois vieram Carlos Chagas, passeios a pé pelo centro, cachorro quente das Lojas Americanas. Até encontrar a Rádio Musical. Paixão a primeira vista. Tanto que trabalhei mais de dois anos de graça. Ai o caminho profissional abriu. Rádio Brasil Central, RBC FM, Araguaia FM, TV Serra Dourada. Primeiro carro, festas nas chácaras pelos arredores. Minha inesquecível cachorrinha Danka, aliás, as duas. Primeiras idas ao autódromo. Corrida de 12 horas, Fórmula Ford, 3, Marcas, Mundial de Moto. Quanta saudade. Encontro com dona Telma e ai São Paulo me chamou.
Fiquei oito anos fora e em dois deles bem distante. Quando voltava nas férias, em dezembro, parecia que tinha encontrado meu ninho de novo. Então decidimos criar o Alê onde tínhamos crescido. Não é mais como na minha adolescência e juventude.
Já não dá para ir ou sair de madrugada dos bares e das festas a pé. Não dá mais para ir ao Serra Dourada levando as bandeiras verdes e em muitos casos, até sacos de lixo cheio de papel picado com talco. Os campos de futebol na terra já eram. A cidade cresceu, muito, onde existiam chácaras, agora são condomínios. A limpeza, é coisa do passado. Iluminação precária, buracos, trânsito complicado e ninguém com criatividade para melhorar. Segurança, a pior possível. Antes entrava em um avião via pelo menos umas quatro caras conhecidas, agora, mesmo mais cheios, não sei quem são.
Mesmo assim ainda é meu porto seguro. A cidade que escolhi para continuar toda semana partindo e voltando. Que escolhi para estar ao lado da Telma, Alê, este um goiano por adoção, já que nasceu em São Paulo. Além do Go Tanks, Spike, Bibber e Luna. Lugar que tenho um prazer totalmente renovável, toda semana, em uma mesa do Kabanas, Piquiras, Maré Alta, Obelisque, 1008 ou outra novidade, em longos papos e com muitos planos ao lado do Fred ou Antoin.
Tenho a sorte de ter adotado, São Paulo como minha outra cidade e ainda deixar lugares especiais para Parintins, Rio, Fortaleza, Bento Gonçalves, Guaporé, BH e tantas outras.
Só que hoje é dia de reverenciar a minha cidade, na Avenida Goiás, antigo Hospital Santa Luiza, na década de 60 eu vinha ao mundo, como um goiano pé rachado e agradecendo muito a Deus por ter vivido tão intensamente pelas ruas, lotes, campinhos, colégios, Autódromo, Serra, rádios, TVs da cidade, ter visto uma jovenzinha, crescer, se tornar adulta e mesmo tão mal tratada, mal cuidada, manter sua personalidade, sua essência nestes 81 anos. Parabéns Goiânia, domingo, no Kabanas, farei um brinde atrasado.